quarta-feira, 15 de junho de 2011

Pedra Bela e Toledo – de 11 a 13 de junho de 2011


Duas cidades, dois Estados e dois ambientes. Tinha tudo para ser uma só viagem, mas foram duas. Como corriqueiro, esqueceram de nos avisar que até mesmo as sensações sentidas em ambas seriam divergentes. Este é o grande prazer de quem viaja: sentir a mudança ora tênue, ora abissal, proporcionada por apenas alguns quilômetros de distância entre um local e outro. Amiúde quedamos estupefatos com nossas descobertas; e amiúde nos deixamos envolver pelos projéteis da disparidade cultural que crivam o peito aberto do indivíduo que resolve vagar sem compromisso ou preconceito pelo mundo afora.
Que faço aqui?
Eu, “Bebê” e “Poste” saímos de Americana exatamente às 13:30h de um 11 de junho atípico, levando conosco quatro rodas, dois motores, três almas e a ideia de percorrer uma rota nem um pouco ortodoxa. Um curto trecho na Anhanguera e pendemos para Cosmópolis, onde localizamos uma estrada de terra metros antes de uma pequena ponte que se eleva sobre o Rio Jaguari. Essa estrada em questão corta canaviais e termina na “cloaca” da cidade de Holambra, a Holanda brasileira. Um Cristo Redentor de grandes proporções, altivo e solitário, surpreendeu-nos em meio aos pastos secos dois quilômetros antes do término do trecho em terra. Perguntamo-nos o motivo de uma obra tão magnânima em terreno tão inóspito. Sem respostas, atravessamos Holambra, sempre fotografando, e chegamos a Santo Antônio de Posse, dirigindo-nos ulteriormente ao distrito de Arcadas e a Amparo, onde tomamos a primeira dose de cafeína da viagem. Subindo uma bela e sinuosa serra alcançamos Tuiuti, na qual embrenhamo-nos por mais uma estrada de terra que desembocou-nos em Pinhalzinho. Pouco mais de meia-hora foi suficiente para que o simples portal de Pedra Bela fosse avistado.
Pôr-do-sol no Morro da Pedra Grande
Logo ao passar o portal estacionamos as motocicletas. À esquerda já era possível avistar o Santuário do Morro da Pedra Grande, cartão-postal da cidade. O sol se punha rapidamente, visto que eram quase 17:20h. Decidimos incontinenti partir dali e subir o morro para apreciar o pôr-do-sol de uma posição mais elevada, o que deixaria o espetáculo bem mais interessante. Uma rampa íngreme teve que ser vencida pelos motores e, se não bastasse o esforço de nossas “poderosas”, ainda fomos obrigados a subir uma interminável escadaria para chegar ao topo do Morro da Pedra Grande, sobre o qual um pequeno Cristo, uma capela e uma grande cruz estão edificados. Em fadiga e sem fôlego, tudo o que pude balbuciar ao chegar ao topo foi: “se a fé não move montanhas, pelo menos constrói igrejas sobre elas”. Meus batimentos cardíacos foram voltando ao normal enquanto admirava o nosso astro-rei docilmente se despedindo de mais um dia.

Vista do fim de tarde do portal de Pedra Bela

Santuário do Morro da Pedra Grande
A história que envolve a construção do Santuário é cercada de quimeras. Diz-se que um fazendeiro pedrabelense acolheu uma criança órfã abandonada em Bragança Paulista e o criou como um legítimo filho. Antônio da Serra, como ficou conhecido, dizia ao pai adotivo que tinha visões de uma mulher linda, iluminada e perfumada, que volta e meia aparecia em seus sonhos e o incitava a construir um templo sobre a Pedra Grande em sua homenagem. O pai, Antônio da Serra, e mais alguns moradores que também acreditavam nas visões do menino, decidiram, então, levar a cabo essa empreitada, carregando vagarosamente todos os materiais necessários ao topo do morro de 50m de altura para que o santuário fosse construído.
Pedra Bela/SP
Com a noite já nos envolvendo, saímos à procura de um lugar para pernoitar. Pedra Bela é uma cidade com cerca de 6000 habitantes. Já foi distrito de Bragança Paulista, depois vila, e emancipou-se em 1964. Está situada na Serra da Mantiqueira, no nordeste do estado de São Paulo, a uma altitude de 1100 metros. Apesar de gozar de uma localização privilegiada, conta com apenas duas pousadas, e uma estava completamente tomada. A outra, a do “seo” Sebastião, nossa única esperança, disponibilizou um quarto assaz aconchegante, com vistas para a Pedra Grande. Acomodamos a bagagem e as motocicletas e principiamos o rotineiro palmilhar pelas ruas da cidade. Encontramos algo para comer numa festa – com o intuito de arrecadar fundos para um asilo – que havia começado há pouco no ginásio poliesportivo. Fomos acolhidos muito gentilmente por todos os envolvidos na festança, e este é um ponto importante a ressaltar, já que muitas vezes nos esquecemos de que ainda existem pessoas, e não somente lugares, dignos de nota por aí. No caminho de volta para a pousada, assolados pelo frio, decidimos comer uma pizza, como bons paulistas. O sono veio e sequer planejamos o dia seguinte.

Portal de entrada para o santuário

Cachoeira Boca-da-Mata
Acordamos às 7h, no domingo, e desjejuamos ao mesmo tempo em que pedíamos informações sobre os atrativos locais. Partimos da pousada em direção novamente ao alto da Pedra Grande, já que agora havia abundância de luz para fotografar. Subimos mais calmamente desta vez, aproveitando a vista sobre cada lance de degraus. Por um tempo estivemos, literalmente, no apogeu de nossas vidas. Com os ventos da realidade uivando, descemos para enfrentar mais uma estrada de terra, que nos levou à pedra Maria Antônia e a seus incríveis 130m de altura. Esta pedra é bem explorada para a prática de escalada. Conversando com um morador de um sítio da região, soubemos da existência de uma cachoeira perto dali, e logo nos dispusemos a localizá-la. A cachoeira Boca-da-Mata, como é chamada por lá, na verdade se trata de uma corredeira. Sob uma ponte de madeira foi possível acessá-la. Descansamos ali por um bom tempo, visto que o frio amainara e o sol luzia forte. Mais uma vez na terra, partimos sem saber onde a estrada terminaria. Para a nossa surpresa, saímos no trevo Munhoz-Pedra Bela-Toledo. Optamos por nos dirigir a Toledo, já no estado de Minas Gerais. Chegamos à pacata cidade por volta do meio-dia.
Pinhal Grande
Toledo conta com aproximadamente 6000 habitantes. Como toda cidade pequena, o que chama a atenção é a igreja matriz. Tudo parece se desenrolar ao redor dela. A Praça São José é o local mais frequentado pelos moradores, e também ajudamos a aumentar tal estatística. Sabendo que uma festa junina aconteceria ali a partir das 16h, procuramos um hotel e decidimos pernoitar nas cercanias da praça. Com algumas horas disponíveis, subimos o morro do cemitério municipal, talvez um dos pontos mais altos da cidade, de onde pudemos observar todo  o território e seus domínios. Descemos a pé até uma pequena cachoeira, que curiosamente fica no lado do estado de São Paulo, e depois seguimos de moto ao bairro Pinhal Grande, onde encontramos uma bela cachoeira no quintal de um sítio. A cidade tem um potencial muito grande para o turismo. Diz-se que 16 cachoeiras pertencem ao território de Toledo, mas não há placa alguma com indicações e mesmo os moradores desconhecem suas exatas localizações.

O céu laranja do fim de tarde em Toledo/MG

Praça São José
De volta à praça, assistimos às apresentações das crianças das escolas locais, comemos comidas típicas de festa junina e admiramos o pôr-do-sol sobre os telhados das casas. Dormimos novamente afrontados pelo frio dos 1100 metros de altitude de Toledo. Logo pela manhã pegamos a estrada, voltando para Pedra Bela, desta feita via asfalto, e passando por Bragança Paulista, Itatiba, Valinhos, Campinas, Sumaré, Nova Odessa e, finalmente, atracando em Americana. Chegamos antes do meio-dia, ainda em tempo de comemorar o aniversário de “Poste”. Meus parabéns ao esquálido parceiro, que tem se mostrado um cúmplice em grandes aventuras por esse Brasil afora. Gostaria eu que essa fosse uma dupla inseparáve, mas infelizmente nossas obrigações trabalhistas muitas vezes nos colocam em caminhos diferentes.
Povo toledense
A simplicidade e o sotaque do povo toledense não deixou de nos cativar. Como dito no primeiro parágrafo da postagem, o ambiente de Toledo diferiu – e muito – do de Pedra Bela. Ambos os locais se mostraram agradáveis e receptivos, mas Toledo pareceu mais tímida, menos senhora de si quanto aos seus recursos humanos e naturais. Falta um pouco de interação do povo com a própria cidade, ao contrário de Pedra Bela, em que todos parecem realmente estar inseridos na dinâmica da cidade. Que fique registrado que eu voltaria para ambos os lugares. É apenas mais um comentário de minha mente analítica.
Passei por estas terras. Fenomenologicamente estas terras também passaram por mim. Tudo estava ali, no quintal de minha casa, também conhecido como mundo, e nunca abri os olhos para que pudesse enxergar. Hoje, mais experiente e bem menos influenciável pelas artimanhas da sociedade, começo a ter noção do tempo que perdi na tentativa de melhorar a mim mesmo intrinsecamente, quando todas as ferramentas que carecia, na verdade, estavam extrínsecas a mim. Não cometo duas vezes o mesmo erro. No quintal de minha casa ou no quintal de outras casas aportar-me-ei. Não desistirei de conhecer tudo o que está ao meu alcance. E, enquanto isso, tentarei encontrar meios de conhecer tudo o que não está.


Mais fotos aqui.

E abaixo um blues em “dois ambientes” para esta viagem. Desculpem-me novamente pela má qualidade. Escutem com o fone de ouvido e no volume máximo.

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